Comunicado do MPPM (Movimento pelos Direitos do povo Palestino e Pela Paz no Médio Oriente)
Israel acaba de ser nomeado para presidir à Sexta Comissão da Assembleia Geral da ONU pelo Grupo dos Estados da Europa Ocidental e Outros, integrado actualmente (além de um observador, os EUA) por 28 Estados, entre os quais se incluem Portugal e — estranhamente — Israel.
A Sexta Comissão é descrita pela ONU como «o fórum principal dedicado ao exame das questões jurídicas na Assembleia Geral». Entre os assuntos em agenda para discussão na 71.a sessão, que terá início em Outubro de 2016, encontram-se questões como «Medidas para eliminar o terrorismo internacional», «O primado do direito aos níveis nacionais e internacionais» e «Responsabilidade dos Estados por actos internacionalmente impróprios». Trata-se de temas que Israel conhece bem, mas perversamente, pelo lado da prática do terrorismo de Estado contra o povo palestino e outros países da região, pelo lado da violação do direito internacional, pelo lado do desrespeito pelas resoluções da ONU.
Israel, impedido de aderir ao Grupo Asiático devido à oposição dos países árabes, é membro permanente do GEEOO desde 2004. Em 2014 Israel tinha já sido nomeado por este bloco regional para presidir à Quarta Comissão da AG da ONU, dedicada à descolonização, o que só por si constituía um insulto às decisões e afirmações da ONU relativamente à erradicação do colonialismo, já que Israel exerce ele próprio um colonialismo de povoamento no território da Palestina e viola persistentemente os direitos nacionais do povo palestino.
É inaceitável que Israel, que continua a infringir o direito e as convenções internacionais, o direito humanitário internacional e incontáveis resoluções da ONU, seja nomeado para encabeçar uma comissão jurídica que visa promover o direito internacional e proteger direitos e liberdades humanos básicos.
Ao nomear Israel, o Grupo dos Estados da Europa Ocidental e Outros está a pôr em causa o sistema jurídico internacional e a recompensar Israel pelas suas violações flagrantes do direito internacional e pelos seus actos de violência e de punição colectiva.
Assim sendo, e tendo em conta as disposições da Constituição, nomeadamente do seu artigo 7º, ao afirmar que «Portugal rege-se nas relações internacionais pelos princípios da independência nacional, do respeito dos direitos do homem, dos direitos dos povos» e que «Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência», o MPPM – Movimento pelos Direitos do Povo Palestino e pela Paz no Médio Oriente:
— condena esta nomeação e lamenta a participação nela de Portugal;
— exorta o governo português a retirar o apoio à nomeação de Israel pelo GEEOO;
— exorta ainda o governo português a desenvolver na ONU acções tendentes a responsabilizar Israel pelas suas persistentes violações do direito internacional e dos direitos humanos e a assegurar o reconhecimento efectivo do direito do povo palestino a um Estado viável, dentro das fronteiras de 1967, com capital em Jerusalém oriental e uma solução justa para o problema dos refugiados.
Lisboa, 10 de Junho de 2016
A Direcção Nacional do MPPM
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Migrantes em protesto em 10 de Abril na fronteira encerrada de Idomeni na Grécia (Foto: AP) |
Quanto mais tempo se permitirá que continuem os massacres no mar? 30 de maio de 2016. Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar.
“Esta semana foi um massacre”, disse um porta-voz da ONG Save the Children [Salvem as Crianças], depois de pelo menos 800 migrantes se terem afogado no Mediterrâneo em três dias.
As razões e responsabilidades foram múltiplas. Os barcos que os transportavam eram armadilhas de morte. Mas mesmo agora, depois de tragédia insuportável atrás de tragédia nas águas do Mediterrâneo central, as potências europeias recusam-se a iniciar uma operação sistemática de busca e salvamento. Milhares de refugiados têm sido recolhidos por barcos de ONGs, por navios de carga que passam, pela marinha italiana e por alguns outros navios militares da União Europeia [UE], mas o principal esforço ocidental continua a estar criminosamente focado na Operação Sophia, concebida e equipada para interditar e prender contrabandistas, para destruir os barcos deles e para intimidar a continuação da migração, e não para salvar as pessoas que se estão a afogar.
Se milhares de pessoas que partiram da Líbia têm sido salvas no Mediterrâneo central, é porque há tantas pessoas a tentar fazer a travessia que mesmo os esforços mais temporários e improvisados as conseguem resgatar. Estas intervenções de salvamento anémicas parecem visar salvar a legitimidade moral dos governos europeus e do Ocidente em geral. Sim, elas salvam algumas pessoas, mas não é possível deixar de se salientar que a situação existente faz com que massacre atrás de massacre no mar sejam inevitáveis. Estas mortes são o resultado de escolhas políticas. Qualquer número de afogamentos é considerado aceitável para impedir que a migração em massa ameace a ordem na Europa.
Esta indiferença pela humanidade é ainda mais demonstrada no modo como eles tratam os refugiados que sobrevivem. Seria, no mínimo, apenas um ligeiro exagero dizer que a UE transformou o governo grego num subcontratado prisional. A resistência obstinada dos refugiados que exigem ser admitidos na UE em Idomeni, na fronteira com a Bulgária, é um embaraço político para a UE. A polícia grega tem vindo a demolir com buldózeres a cidade de barracas e a levar os seus residentes para abrigos temporários em bases militares e outros estabelecimentos. A razão oficial é que o acampamento não é adequado para habitação humana. Mas os relatos iniciais das ONGs indicam que as redes que elas conseguiram estabelecer em Idomeni para fornecer serviços mínimos de saúde pública, apoio médico, ensino e outros têm sido destruídos, sem terem sido substituidos .
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Migrantes em Idomeni enfrentam a polícia ao tentarem deitar abaixo uma parte da cerca da fronteira entre a Grécia e a Macedánia para entrarem na Europa, 7 de Abril de 2016. (Foto: AP/Amel Emric) |
A Save the Children diz que os novos acampamentos geridos pelo governo no norte da Grécia não têm instalações sanitárias adequadas. Os adultos e as crianças não estão a receber água suficiente, nem alimentos para comerem mais que uma vez por dia, nem os materiais de higiene mais básicos. A ONG também adverte do perigo para as crianças desacompanhadas, agora que essas cadeias informais existentes foram rompidas e que as relações que tinham foram destruídas (aparentemente, já nem sequer fazem um registo de quem foi enviado para onde), e de os pais e os filhos ficarem separados na pressa do governo grego para evacuar Idomeni. É inegável que esta atuação visou pôr as pessoas longe da vista e sob controlo, e que não foi mais motivada pela preocupação com o bem-estar delas que no caso do que as marinhas ocidentais estão a fazer no Mediterrâneo.
As escolhas políticas que estão a funcionar ficaram ainda mais aparentes com o estabelecimento de um governo fantoche apoiado pelo Ocidente na Líbia, cujo objetivo, entre outros, é transformar o país num muro para manter as pessoas fora da Europa, um projeto ainda mais criminoso que fútil. Este “governo” de papel visa autorizar os navios da NATO a invadir o litoral líbio, controlar os portos e destruir os barcos de pesca e outras embarcações vistas como potenciais barcos de contrabando, que a Grã-Bretanha, em particular, rotula como uma ameaça à segurança da Europa. Estas medidas podem vir a incluir operações armadas europeias em solo líbio – após anos de intervenção militar norte-americana e europeia, sob pretexto atrás de pretexto, tentando, sob dominação ocidental, repor a unidade de um país que a interferência ocidental destruiu.
É verdade que há contrabandistas sem preocupação com as vidas humanas – o que não é diferente, digamos, dos capitalistas financeiros que investem em companhias tabaqueiras, dos fabricantes de armas centrais nas economias ocidentais, das grandes marcas ocidentais de roupa cujas fábricas fornecedoras no Bangladesh são armadilhas de morte ainda maiores, ou de qualquer dos donos e representantes políticos do capital financeiro que estão a destruir o planeta e os seus habitantes. Qualquer que seja a responsabilidade destes oportunistas menores, esse não é o problema fundamental.
O problema fundamental é um sistema imperialista globalizado de exploração económica e dominação política que faz com que o risco de morte seja a melhor opção disponível para tantas pessoas nos países dominados por este sistema. Que podemos dizer sobre o modo como o mundo está organizado quando muitas pessoas da Eritreia, da Gâmbia, do Gana e da Nigéria, de onde veio a maioria dos mortos desta semana, estão tão desesperadas quanto as pessoas de países dilacerados pela guerra como a Síria?
A reação das potências europeias a esta “crise” é fazer com que a prioridade delas seja manter as pessoas do lado de fora – usando a polícia e os exércitos deles para imporem a atual ordem mundial num momento em que a crise “migratória” mostra o quanto a atual divisão do mundo é inaceitável e insustentável.